Todo uniforme tem uma história.
O Portland Trail Blazers é uma das franquias com identidade visual mais sólida e reconhecida na NBA. No entanto, para o seu uniforme City Edition da temporada 2020-21, adotou cores atípicas que celebram a bela paisagem do Oregon e contam a história das tribos que povoaram suas terras. Começa aqui o review completo de um dos meus City Edition preferidos da temporada 2020-21!
Os Trail Blazers decidiram ampliar o conceito de City Edition e estão homenageando não apenas a sua cidade, mas todo o estado. O uniforme ganhou o nome extraoficial de “Spirit of Oregon”, que na minha tradução livre significa “Espírito do Oregon”.

De cara, observa-se que no logotipo do peito não está escrito Portland, ou Blazers, mas Oregon. É a primeira vez que a franquia tem um uniforme com o nome do seu estado. A fonte escolhida, que nada tem a ver com o repertório imagético dos Blazers, foi adaptada de um famosíssimo letreiro luminoso que fica em Portland. Para ele vou escrever uma seção dedicada nesse post.
O letreiro neon Portland Oregon
Próximo ao centro da cidade de Portland, no topo de um edifício, à beira de uma avenida movimentada, está instalado um letreiro de luzes neon que, em certa medida, ajuda a contar a história de Portland, do Oregon e das empresas que movimentavam a economia local.

Ele foi inaugurado em setembro de 1940. O layout era formato pelo mapa do Oregon e, dentro dele, o logotipo da fabricante de açúcar White Satin Sugar.
Observe que o letreiro ficava acima do prédio onde funcionava a White Stag Manufacturing, uma empresa de roupas esportivas. Em 1957, a White Stag substituiu a marca de açúcar e passou a ocupar o letreiro. Ela refez o layout para exibir o texto White Stag Sportswear e adicionou a silhueta de um veado, que era marca da empresa. No período do Natal uma luz vermelha era acesa no nariz dele, para que fizesse referência às renas que puxam o trenó do Papai Noel. Tradição fofa que é mantida até hoje.

Em 1977 o letreiro de cores vivas já era parte da paisagem, ponto de referência para a região. Um conselho local o designou oficialmente um cartão-postal da cidade de Portland. Era uma forma de reconhecer a importância daquele local para a economia e para a história da cidade.
Mais de três décadas se passaram, a White Stag, que agora pertencia ao Warnaco Group, já não tinha mais negócios no Oregon e não pretendia renovar o contrato de uso do letreiro. Então, a H. Naito Corporation, que ocupava naquele momento as salas do prédio, fez um acordo com a Ramsay Signs, dona do letreiro. A Naito seria responsável pelo fornecimento de energia e a Ramsay pela manutenção. Tudo lindo, né? Só que não. Em 1996, as empresas entraram em desacordo sobre quem pagaria por reparos mais caros e, com esse impasse, o letreiro corria risco de não ser mais utilizado ou até ser removido.

A Prefeitura de Portland interviu e um novo acordo foi selado. Nele, a Naito tinha um longo período de uso do letreiro. Em 1997 ela promoveu a segunda mudança no layout e passou a exibir o nome de sua loja de presentes chamada Made In Oregon. A família tipográfica foi mantida, assim como o mapa do Oregon e a silhueta do veado. O termo “Sportswear” foi substituído por “Old Town”, nome do bairro em que estava situado.
A paz reinou até 2008, quando o letreiro novamente se viu sem anunciante. Naquele momento, as salas do prédio eram ocupadas por setores da Oregon University, que até tentou assumir o anúncio e alterar novamente o layout. Mas o povo de Portland, orgulhoso, não gostou da ideia de exibir uma marca que sequer tinha sede na cidade – a universidade fica em Eugene.
Para contornar essa situação, integrantes da Prefeitura começaram a explorar formas sustentáveis de utilizar o letreiro. Em setembro de 2010 foi firmado um acordo entre a Prefeitura, a Ramsay Signs, proprietária do letreiro, e a Venerable Properties, proprietária do edifício. O cartão-postal de Portland agora era controlado por sua própria Prefeitura. O letreiro foi reinaugurado no Dia da Ação de Graças de 2010. A mensagem escolhida foi a mais simples e direta possível: Portland Oregon.


Comparando as imagens você notará que nenhuma grande mudança ocorreu. Substituíram a expressão “Made by” por “Portland”. O texto Oregon, assim como o mapa e o veado são as mesmas peças dos layouts antigos.
Se você quiser ter uma visão mais realista, divirta-se com o Google Maps.
Esse letreiro é um dos símbolos mais queridos e reconhecidos por quem mora em Portland. E os Trail Blazers o exibem com orgulho na sua camisa.
Você tem dúvida sobre o que é um uniforme City Edition? Leia o Guia Completo das Camisas da NBA!
A topografia como estampa
O principal orientador para a aparência desse uniforme é a geografia do Oregon. O terreno bastante acidentado, as montanhas, as cores do solo, dos rios e do céu.
Um olhar atencioso para a parte marrom vai te fazer notar que há uma textura cheia de linhas e curvas. Isto é um mapa topográfico. Você certamente já viu algum desses em um livro de geografia. Grosso modo, a topografia é a representação visual dos acidentes naturais ou artificiais de uma região. Os traços representam a variação de altura do solo.
O painel lateral do lado esquerdo tem uma faixa colorida toda irregular. Ela é uma composição de 5 cores que, numa forma meio poligonal, destacam o terreno acidentado do Oregon e simulam as diversas camadas do solo, com tons mais terrosos, quentes e outros azuis que nos lembram dos rios.
Eu vou deixar uma imagem do Carmelo Anthony aqui pra você deslizar lentamente e curtir esse belo uniforme.

O estilo do número não é o tradicional da franquia, mas também não é inédito. É uma reprodução do blockletter utilizado no uniforme dos Blazers nos anos 70, na geração que ficou marcada por Bill Walton e pelo título na temporada 1976-77.

Uma sutileza interessante desse uniforme é o logotipo da Nike. Ele tem um tom de laranja que pode passar despercebido, pois combina com as demais cores do uniforme. Mas esse é o exato tom de laranja usado no logotipo da Nike. E adivinha onde fica a sede da Nike? No Oregon! É tipo um “easter egg”. Essas coisas me agradam.
Acima da jock tag está escrita a frase “We will always be here”, que significa “Nós estaremos sempre aqui”, numa tradução livre. É um aceno à presença das tribos no passado, no presente e no futuro do Oregon. Apesar de discreta, se relaciona bem com um uniforme que pretende destacar características da natureza local.

No elástico do short há um mapa do Oregon preenchido com triângulos azuis que apontam para cima. Triângulos são um símbolo importante na cultura dos nativos, frequentemente utilizados para representar a importância do lar e da família nas tribos. O território que hoje é conhecido como o estado do Oregon foi povoado por 9 tribos, por isso 9 triângulos foram reproduzidos.
Benefício para as tribos locais
Parte do lucro obtido com as vendas do uniforme é destinada à Naya (Native American Youth and Family Center), uma organização sem fins lucrativos que estimula a manutenção das tradições, o reconhecimento da cultura e da identidade dos nativos e suas famílias.
Além do site oficial, você pode seguir a Naya no Twitter e no Instagram.
Pra encerrar, uma curiosidade: a Nike costuma nomear as cores que usa nos uniformes. O marrom predominante dos Trail Blazers se chama “dark cinder”. O amarelo claro do logotipo e números se chama “cream white”. Essa cor já apareceu em alguns uniformes do Philadelphia 76ers.
Minha opinião
Apesar de as cores não fazerem parte da marca do Portland Trail Blazers, o uniforme, curiosamente, não é tão desconectado do que a franquia costuma praticar na sua comunicação. O tom amarelado, o amarelo claro meio cor de “creme”, o marrom, o laranja… formam um mix que se identifica com o Blazers, cria um contraste parecido com o unifome tradicional e até se parece com alguns alternativos que já vestiram.
A assimetria provocada pelo painel lateral é linda. Gola e mangas tem a simplicidade ideal. O número tradicional dos Blazers funcionaria bem nessa camisa. A alteração para o número clássico não era necessária, mas também não atrapalhou.
O “easter egg” no tom de laranja do logotipo da Nike, ainda que seja um movimento puramente comercial, me agrada muito. O tipo de sutileza criativa que arregala os olhos.
O tema num primeiro momento parece “vazio”, mas se revela bem complexo e mistura três elementos – o letreiro “Oregon”, a geografia local e a influência dos nativos – com razoável destaque para cada um. Senti falta de uma referência mais explícita às tribos nativas. O detalhe no short me deixou com a sensação de que faltou algo.
Avaliação:
